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Erro de Cálculo

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Um pequeno murmúrio de som – não aqui, á umas centenas de metros ao norte – me fez pular. Minha mão agarrou automaticamente o telefone, trazendo o telefone mais pra perto e escondendo ele com o mesmo movimento.
Eu joguei meu cabelo por cima do ombro, dando uma olhadinha para as altas janelas que davam para a floresta. O dia estava escuro e sombrio; o meu próprio relaxo era mais claro do que as árvores e as nuvens. Eu olhei para os meus olhos arregalados, alarmados, os meus lábios estavam curvados pra baixo nos cantos, havia uma pequena ruga vertical entre as minhas sobrancelhas…
Eu fiz uma carranca, apagando a expressão de culpa e colocando uma de escárnio em seu lugar. Um escárnio atraente.
Ausentemente eu reparei o quanto aquela expressão furiosa combinava com o meu rosto, contrastando muito bem com o dourado benigno dos meus cachos grossos. Ao mesmo tempo, os meus olhos rastreavam a floresta vazia do Alaska, e eu fiquei aliviada de ver que eu ainda estava sozinha. O som não era nada – um pássaro ou a brisa.
Não havia motivo para alívio, eu disse pra mim mesma. Não há motivo para culpa. Eu não havia feito nada de errado.
Será que os outros estavam planejando nunca contar a verdade a Edward? Deixá-lo chafurdar na angústia em uma favela suja pra sempre, enquanto Esme vivia pesarosa e Carlisle ficava tentando adivinhar todos os seus passos e a alegria natural da existência de Emmett ia se secando junto com a sua solidão?
Como isso era justo?
Além do mais, não tinha jeito de esconder segredos de Edward por muito tempo. Mais cedo ou mais tarde ele teria vindo nos encontrar, pra ver Alice ou Carlisle por algum motivo, e aí ele iria descobrir a verdade. Será que ele ia nos agradecer por termos mentido pra ele com o nosso silêncio? Dificilmente. Edward sempre tinha que saber de tudo; ele vivia por aquele sentido de omnisciência. Ele teria um enorme acesso de fúria, e isso ia ficar ainda pior pelo fato de termos escondido a morte de Bella dele.

Quando ele se acalmasse e superasse toda essa bagunça, ele provavelmente ia me agradecer por ter sido a única a corajosa o suficiente pra ser honesta com ele.
A quilometros de distância, um gavião gritou; o som me fez pular e eu olhei para a janela de novo. Meu rosto continuava com a mesma expressão de raiva de antes, e eu rosnei pra mim mesma no vidro.
Tudo bem, então eu tinha a minha própria agenda. Será que era uma coisa tão ruim querer que a minha família estivesse junta de novo? Será que era tão egoísta sentia falta da paz de todos os dias, da alegria subjacente que eu já considerava garantida,
a alegria que Edward havia levado com ele naquele avião?
Eu só queria as coisas do jeito como elas eram antes. O que havia de errado? Não parecia tão horrível. Afinal, eu não havia feito isso somente por mim, mas por todos. Esme e Carlisle e Emmett.
Não tanto por Alice, apesar de eu ter pensado… Mas Alice tinha estado tão certa da forma como as coisas terminariam no final – que Edward seria incapaz de ficar longe da sua namoradinha humana – que ela nem se incomodou em lamentar. Alice sempre funcionou de um jeito diferente do resto de nós, trancada em sua realidade que estava sempre mudando.
Já que Edward era o único que podia participar da sua realidade, eu pensei que a ausência dele seria mais difícil pra ela. Mas ela estava segura como sempre, vivendo o futuro, com sua mente em um tempo onde o seu corpo não podia alcançá-la. Sempre tão calma.
No entanto, ela ficou frenética o suficiente quando viu Bella pular…
Será que eu havia sido muito impaciente? Agido rápido demais?
Eu precisava ser honesta comigo mesma, porque Edward veria cada pedacinho da petulância na minha decisão assim que ele chegasse em casa. Eu precisava saber das minhas más motivações e aceitá-las agora.
Sim, eu tinha inveja do jeito que Alice se sentia em relação á Bella. Será que Alice ia sair correndo com tanta pressa, tão louca de pânico, se ela tivesse visto que era eu pulando de um penhasco?
Será que ela precisava amar aquela garota humana comum tão mais do que a mim?
Mas a inveja era só uma coisinha pequena. Eu posso ter apressado a minha decisão, mas não foi isso o que me controlou. Eu teria ligado pra Edward da mesma maneira.
Eu tinha certeza de que ele preferia a minha honestidade cega do que a decepção mais gentil dos outros. A bondade deles estava condenada desde o início; Edward ia ter que voltar pra casa eventualmente.
E agora ele ia voltar pra casa mais cedo.
Não era só da felicidade da minha família que eu sentia falta.
Honestamente eu tinha saudades de Edward também. Eu sentia falta das observações agudas dele, o humor negro que estava mais em sintonia com o meu próprio, do que o espírito ensolarado, e as piadas de Emmett. Eu sentia falta da música – o som dele no volume mais alto no seu estúdio improvisado, e do piano, o som de Edward tecendo os seus pensamentos geralmente remotos e deixando-os transparentes através da música. Eu sentia falta dele sussurrando na garagem ao meu lado enquanto tunavamos os carros, o único momento em que estávamos em perfeita sintonia.
Eu sentia falta do meu irmão. Certamente ele não me julgaria muito mal quando visse isso nos meus pensamentos.
Seria desconfortável por um tempo, eu sabia disso. Mas quanto mais cedo ele voltasse pra casa, mais cedo as coisas voltariam ao normal de novo…
Eu procurei em minha mente algum pesar por Bella, e fiquei satisfeita de ver que eu lamentava pela garota. Um pouco. Pelo menos, isso: ela fez Edward feliz de um jeito que eu nunca o havia visto antes. É claro, ela também o deixou mais infeliz do que qualquer outra coisa em seu século de vida. Mas eu ia sentir falta da paz que ela deu pra ele durante aqueles poucos meses. Eu realmente lamentava a perda dela.
Esse pensamento fez eu me sentir melhor em relação a mim mesma, complacente. Eu sorri para o meu próprio rosto no vidro, cercado pelos meus cabelos dourados e as paredes vermelhas da sala de estar longa, confortável de Tânia, e aproveitei a vista.
Quando eu sorria, não havia mulher ou homem nesse planeta, mortal ou imortal, que pudesse se comparar a mim em padrões de beleza.
Esse era um pensamento confortante. Talvez eu não fosse a pessoa mais fácil pra se conviver. Talvez eu fosse superficial e egoísta.
Talvez eu tivesse um carater melhor se tivesse nascido com um rosto comum e um corpo sem graça. Talvez eu fosse mais feliz dessa forma. Mas isso era impossível de comprovar. Eu tinha a minha beleza; era uma coisa com a qual eu podia contar.
Meu sorriso aumentou.
O telefone tocou e eu automaticamente apertei minha mão, apesar do som ter vindo da cozinha, não do meu pulso.
Eu soube imediatamente que era Edward. Ligando pra checar a informação que eu tinha dado. Ele não confiava em mim.
Aparentemente, ele me achava cruel o suficiente pra fazer piada com isso. Eu fiz uma carranca enquanto me movimentava para a cozinha pra atender o telefone de Tânia.
O telefone estava bem na pontinha do longo balcão de açougue. Eu o peguei antes que o toque acabasse, e me virei para olhar para as portas Francesas enquanto atendia. Eu não queria admitir, mas eu sabia que estava esperando a volta de Emmett e Jasper. Eu não queria que eles me ouvissem falando com Edward. Eles iam ficar com raiva…
“Sim?”, eu respondi
“Rose, eu preciso falar com Carlisle agora”, Alice disparou.
“Oh, Alice! Carlisle está caçando. O que – ?”
“Tudo bem, assim que ele voltar”.
“O que é? Eu vou procurar por ele agora mesmo e pedir pra ele te ligar -”
“Não”, Alice interrompeu de novo. “Eu vou estar num avião. Olha, você teve alguma notícia de Edward?”
Foi estranha a forma como o meu estômago revirou, ele pareceu descer no meu abdomem. O sentimento veio com um estranho deja vu, uma fraca pontada de uma memória humana perdida a muito tempo.
Nausea…
“Bem, sim, Alice. Na verdade. Eu falei com Edward. Ha apenas alguns minutos”. Por um breve segundo eu brinquei com a ideia de fingir que Edward tinha me ligado, só uma coincidência ocasional.
Mas é claro que não havia nenhuma necessidade de mentir. Edward ia me dar problemas quando voltasse pra casa.
Meu estômago começou a se apertar estranhamente, mas eu o ignorei. Eu decidi ficar com raiva. Alice não devia agir desse jeito comigo. Edward não queria mentiras; ele queria a verdade. Ele me apoiaria nisso quando voltasse pra casa.
“Você e Carlisle estavam errados”, eu disse. “Edward não ia gostar de ser enganado. Ele queria a verdade. Queria sim. Então eu a dei pra ele. Eu liguei pra ele… Eu o liguei muito”, eu admiti. “Até que ele atendeu. Deixar uma mensagem teria sido… errado”.
“Porque?”, Alice asfixiou. “Porque você faria isso, Rosalie?”
“Porque quando mais cedo ele se acostumar com isso, mais cedo as coisas voltarão ao normal. As coisas não iam se facilitar com o tempo, então pra que atrasar? O tempo não vai mudar nada. Bella está morta. Edward irá se lamentar e depois ele vai superar. É melhor ele começar agora do que mais tarde”.
“Bem, no entanto, você está errada das duas formas, Rosalie, então isso seria um problema, você não acha?”, Alice perguntou num tom furioso, violento.
Errada das duas formas? Eu pisquei rapidamente, tentando entender.
“Bella ainda está viva?”, eu sussurrei, sem acreditar nas palavras. Só tentando descobrir a que formas Alice estava se referindo.
“Sim, é isso mesmo. Ela está absolutamente bem -”
“Bem? Você viu ela pulando de um penhasco!”
“Eu estava errada”
As palavras pareciam tão estranhas na voz de Alice. Alice, que nunca estava errada, que nunca era pega de surpresa…
“Como?”, eu cochichei.
“É uma longa história”.
Alice estava errada. Bella estava viva. E eu tinha dito…
“Bem, você fez uma tremenda confusão”, eu rosnei, transformando o meu pesar em acusação. “Edward vai ficar furioso quando voltar pra casa”.
“Mas você está errada sobre essa parte também”, Alice disse. Eu podia notar que ela estava falando por entre os dentes. “É por isso que eu estou ligando…”
Errada sobre o que? Edward voltar pra casa? É claro que ele vai”, eu ri de zombaria.”O que? Você acha que ele vai dar uma de Romeu? Ha! Como algum estúpido, romântico -”
“Sim”, Alice assobiou, a voz dela estava como gelo. “Foi exatamente isso o que eu vi”.
A dura convicção das palavras dela fizeram os meus joelhos ficarem esquisitamente instáveis. Eu me agarrei ao suporte de madeira da parede pra ter apoio – apoio que o meu corpo duro como diamante não precisava. “Não. Ele não é tão estúpido. Ele – ele deve se dar conta disso – ”
Mas eu não consegui terminar o resto da frase, porque eu podia na minha cabeça, uma visão de mim mesma. Uma visão de mim. Uma visão impensável da minha vida se Emmett deixasse de existir. Eu estremeci horrorizada pela idéia.
Não – não havia comparação. Bella era só uma humana. Edward não queria que ela fosse imortal, então não era o mesmo. Edward não podia sentir o mesmo!
“Eu – eu não queria que as coisas fossem assim, Alice! Eu só queria que ele voltasse pra casa!”, minha voz era quase um uivo.
“É um pouco tarde pra isso, Rose”, Alice disse, mais dura e mais fria do que antes. “Guarde o seu remorso pra alguém que acredite nele”.
Houve um click, e depois o som da linha.
“Não”, eu sussurrei. Eu balancei minha cabeça lentamente por um momento. “Edward tem que voltar pra casa”.
Eu olhei para o meu rosto no painel de vidro das portas Francesas, mas eu não conseguia mais vê-lo. Era só um vulto sem forma de branco e dourado.
Depois, apesar de tudo, á distância na mata, uma enorme árvore desabou erraticamente, fora de contexto com o resto da floresta. Emmett.
Eu arranquei a porta pra fora do meu caminho. Ela fez um barulho agudo contra a parede, mas o som estava muito atrás de mim enquanto eu corria em direção ao verde. “Emmett!”, eu gritei. “Emmett, socorro!”

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